domingo, 23 de junho de 2013

Multimodalidades da fala e da escrita

Multimodalidades da fala e da escrita

 
Prof. Ms. Neilton Farias Lins

O uso da linguagem demanda ações praticadas de formas individuais ou mesmo sociais, essa prática se dá por manifestações sócio discursivas, as quais, são realizadas em um gênero textual, seja ele escrito ou oral. Nesse aspecto, é necessário que se concorde com o que defende (BAZERMAN, 1997, p. 9), gêneros “não são apenas formas”, mas “quadros de ações sociais”.
Quando alguém interage de forma falada, na sua mais simples forma (conversação) ou nas mais complexas, mediadas por recursos da tecnologia (bate-papo virtual, celular, redes sociais, dentre outros), está submerso num diálogo multimodal. Ao se ler um texto escrito á mão, texto impresso, ou em um computador, diante destas situações o sujeito estará envolvido em diálogo multimodal. Isso leva a inferir que os gêneros falados e escritos são multimodais, porque quando se fala ou se escreve um texto, é usado, pelo menos, duas maneiras para essa ação: palavras e gestos, palavras e entonações, palavras e imagens, palavras e tipografia, palavras e sorrisos, palavras e animações, etc. Nessa perspectiva, é possível inferir que a multimodalidade dialógica é um traço constitutivo a todos os gêneros textuais escritos e orais.
Até muito tempo, achou-se que a fala e a escrita eram consideradas modalidades da língua com características próprias e restritas em sua forma de realização, que tais modalidades não poderiam se apresentar de muitas maneiras, ou melhor, a língua se dava na escrita de uma única forma, como no livro ou revista, a fala apenas na sua forma primitiva a conversação.
Entretanto, Linguística tem mostrado que ao falar, é usado não apenas a voz como também o corpo, além disso, também entra em uso no momento da interação, segundo Kerbrat-Orecchioni (2006, p. 39) elementos tais como os paraverbais, não verbais, a tonalidade da voz que pode sinalizar uma pergunta, uma reclamação, um elogio, uma crítica, por exemplo.
Uma filha chega para mãe, vestida de uma roupa que acaba de comprar e pergunta se ela gostou, imediatamente a genitora abre um sorriso um tanto sarcástico e responde que sim. No entendimento da filha, duas possibilidades poderá tirar como resposta. Digamos que baseado na afirmativa da mãe, use o sim como resposta, se, no entanto, a filha observar os não verbais da mãe, verá que houve uma ironia, o que ela quis dizer, disse não com palavras, mas com os não verbais. Baseado nesse principio é possível inferir a fala é multimodal, pois sua realização se dá não apenas por meio de recursos verbais, mas através de paraverbais e não verbais. No exemplo citado foi usado dois modos de construção das informações envolvidas no ato de fala.
Na realização de enunciados falados, expressões faciais, determinados timbres de voz, o olhar, o riso, uma gesticulação com a cabeça, ajuda de forma contundente para construção do sentido do linguístico do que é dito, mais ainda, substitui um enunciado da língua nas conversações ou processo interacional face a face. Daí, é necessário afirmar que as conversas espontâneas construídas no dia-dia estão abarrotadas do misto do verbal e do não verbal.
Considere o exemplo:

(1)Transcrição 02[1]
L1 – belo discurso seu! quer dizer enTÃO::: que tu ((L1aponta para L2)), vai descer do alto? sentar no trono. colocar suas mãos puras e santas nos meus::((L1 bate no peito como um forma de demonstração de poder sobre aquelas pessoas)) cachorrinhos sujos, É:::?
L2 – se for preciso sim, porque ainda há santos na minha presença, dispostos a me honrar, me adorar, me servir. ((L2 aponta para L1)) agora seus SERvos satanás são todos movidos pelo prazer.
L1 – então vai, ((gesticula com se estivesse expulsando L2)) usa teus servos em vão, porque o inferno para onde muitos vão ((L1 aponta para a plateia como se estivesse envolvendo a mesma na peça e as predestinando ao inferno)) é muito pior.
L1 – vamos brincar?
L1- eu vou brincar de te acusar, ((L1 aponta para L2, mostrando que é ele que será acusado)) mostrarei o seu pecado de estimação:::((L1 pisa no chão com violência como forma de insulto)) aqui em cima ou quer dizer que vocês também não tem pecado.
L1 – e vocês ((aponta para plateia)) querem brincar ou não?

Os elementos não verbais estão nessa transcrição apresentados dentro de dois parênteses duplos, o que para regra de transcrição da fala se dão quando o documentador faz um comentário que não pode ser do texto falado, mas trata-se de não verbais ou paralinguísticos, no primeiro turno dessa transcrição, o documentador tenta informar o que ouve, e no caso, ele diz que L1 usa o dedo apontando para L2 como se tentasse mostrar com quem falava, além disso, L2 também queria que L1 soubesse sua fala se referia a ele. Já no segundo comentário desse turno, L1 usa as próprias mãos para mostrar para seu interlocutor que os cachorrinhos a que ele se referia em seu turno eram propriedades dele.
No terceiro turno, que se tratar do segundo turno de L1, o esse usa as mãos, gesticulando de forma que L2 compreendesse que deveria sair dali, segundo o comando de L1, assim como também, estivesse dizendo a L2 que quem mandava ali era L1, no segundo comentário desse turno, L1 gesticula tentando de certa forma envolver a plateia em seu discurso, dando-lhe uma alerta de que essa seria a condição de todos os quais viessem se envolver com a mesma situação a que se encontravam as personagens da peça teatral. Os elementos não verbais e paralinguísticos tendem a seguir os elementos verbais nos textos falados, os quais podem ser reformulações do gênero escrito, os quais se dão, por exemplo, nos textos escritos de peças teatrais e roteiros de filmes, como se vê no fragmento apresentado anteriormente.
A grande maioria dos os gêneros textuais escritos são multimodais, mas há de convir, que nem todos os gêneros visuais são multimodais. Considere as fotos:


O pôster (imagem 02) de Barack Obama é multimodal, entretanto como, a foto (Imagem 01) do Presidente não é multimodal, uma vez que a referida foto tem apenas uma leitura, não possui outros elementos constitutivos da língua nessa foto. Entretanto, o pôster em que Barack Obama se dirige a alguém, apontando o dedo, como se olhasse nos olhos de seus interlocutores, tem uma força muito grande, isso é perceptível pelos reforços de elementos postos, não apenas na escrita que diz: SOCIALISTA: falando do dinheiro dos outros ganhos de forma dura e ao fato de dar esse dinheiro aos empreendedores inferiores, mas também nos gesto de apontar, se dirigindo diretamente ao seu interlocutor, além disso, o olhar fixo no interlocutor.[2]
Nessa perspectiva, infere-se que a essas duas modalidades da língua possuem outras modalidades, e seria inútil querer reduzir a analise da fala e a escrita levando em consideração critérios descontextualizado de seus usos.


[1] A análise semiótica das fotos aqui surge na expectativa de demonstrar apenas que nem todos os gêneros visuais se constitui multimodal.


[2] Retirado da Segunda Transcrição de uma peça teatral, o qual é elemento de análise da minha Dissertação de Mestrado intitulada "O processo de oralização de um texto escrito - UFAL".


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